Eu não sou argentina. É que se prendo meu cabelo de lado o prendo em um rabo, e me atiro ridiculamente aos anos 80. Não uso botinhas de couro com calças coladas. Não tenho o nariz fino, os cabelos longíssimos, os olhos pintados com linhas grossas marcadas. Compro alfajores nos kioskos todos os dias e me assusto com o preço das bebidas nos bares. Me assusto também de que aqui eu posso comprar livros ao léu. E as pessoas falam em buxixos. Nem dá para ouvir música pelas ruas daqui, ou se perde os buxixos.
Retomei o brevíssimo vício em café con leche y mediaslunas. Retomei o vício em cafés. Sou tão estrangeira que as pessoas até me entendem. Até dizem que falo bem uma língua que eu não falo. Sou tão estrangeira que me mato de rir quando o português encontra o espanhol no som, mas não no sentido.
Fui recebida em um milhão de apartamentozinhos velhos que só conhecia por fora. As chaves são como de avós, como ser avós, o chuveiro jorra para dentro de uma banheira branquinha, sobe-se em elevadores com grades e sem câmeras, há um balcãozinho absolutamente porteño encarando um punhado de história e outro de modernidade. Me parece que todas as chaves são a mesma.
Buenos Aires é uma jovem vestida de velha e seu exato oposto. É trânsito e distância e generalizações, sim, mas para chegar a particularidades e pessoalidades e velharias deliciosas de que os porteños não abrem mão. E que são, por isso mesmo, generalidades.
La Plata não é para ser vista. Tem lá seu centrinho que quer ser qualquer outra coisa, mas aí está o que tem de menos interessante. É uma cidadezinha fria e cinzenta que mais parece um teco de Europa com argentinices. Deve ser o contrário. Tão feinha de se entrar, coitada, mas foi me abrindo um sorriso e uma vontade de ficar, ao menos até não conseguir mais classificá-la. Uma caixinha de vontades e de coisinhas adoráveis. Um confim de casinhas todas juntas, mas cada uma a seu modo.
Eu não sou argentina. Que delícia estar aqui.