quarta-feira, 24 de agosto de 2011

La lengua de acá

Quando soube que viria à Argentina pensei que aprenderia castelhano, e, sobretudo, esse jeito argentino de falar castechano, ou não bem isso, porque o nosso ch não tem bem o chiadinho leve e lindo que sai da boca das pessoas todo o tempo.  Por um segundo esqueci, para me lembrar tão logo cheguei, que o mais divertido de tudo é aprender a fala, mais do que a língua. 

É claro que há um monte de coisas que, relapsa que sou, vim sem saber e o saberia se tivesse estudado: clase é aula e aula é classe, sala de aula. Mate é a cuia, não a yerba - cherba, com o mesmo chiadinho curioso. E nessas até acabo aprendendo algo do Chile e descobrindo que na Argentina, tanto quanto no Brasil, é engraçado descobrir que a palavra chilena para palheta é uñeta.

Mas como falam as gírias de um povo! Como falam que eles são eles e a gente é estrangeiro! Como uma letradíssima amiga brasileira que, chegando a Buenos Aires depois de fazer todos os seus devidos módulos de aulas de espanhol, não compreendia qual a porra da graça em perguntar na rua onde podia tomar o ônibus. É que a livraiada toda por vezes esquece que existe América Latina e ensina espanholices como regras gerais, e a inocência de um ¿Dónde puedo coger el colectivo?, coger = tomar, colectivo = ônibus, se codifica em coger = foder, e, assim, em uma pergunta indagando onde é a suruba (Penteado, 2011). Ao que os argentinos, sempre gentis e amigáveis, lhe respondiam: bem aqui. Mais fácil e seguro dizer "tomar", sempre com o receio de que em alguma outra província isso queira dizer outra coisa.

Há também, para enorme divertimento escatológico, um monte de expressões com a palavra "pedo"! Sim, e sem falsos cognatos dessa vez! Aqui não se diz que alguém está borracho, bêbado, mas "en pedo"! Não  se está à toa, se está "al pedo"! E nosso clássico "nem fudendo" se transforma em "ni en pedo"! Claro que a essa altura essas expressões, as mais correntes, já fazem parte do meu vocabulário, mas ainda sem perder o assombro e a risada da primeira vez.

Exitem também aquelas coisas que se diz aqui e que não soam estrangeiras, mas perdidas em alguma década esquecida em nosso próprio país. É o caso da palavra "onda". Não sei se por alucinação ou mescla de produções globais com esteriotipias gringas, mas algo me diz que essa era uma gíria nacional, perdida em algum lugar entre as décadas de 70 e 90. "Qual é a onde?", talvez? Nem idéia. Mas aqui é algo que tem a ver com o clima das coisas, com a impressão que se tem sobre elas: que buena onde tem as coisas legais, interessantes, lindas. Que mala onde tem o bróder que fechou a cara pra você na loja - não, no kiosco, cuja grafia, me fizeram notar recentemente, é controversa. E sempre se pode perguntar, para saber o que acontece-como estão as pessoas-se têm vontade de fazer algo-etc e tal: que onda? Se não souber responder, ou quiser enfiar na conversa qualquer coisa mais ou menos equivalente a um "sei lá", um intermediário entre não saber e não se importar, apele para o recorrente ¿que sé yo?


Por hora é o que me vêm à mente. Volto ao mate e ao vinho para me acercar dessa cultura gostosa, com um comentário final, infantilíssimo, eu sei, e por isso o mastigo com mais sabor: aqui as pessoas realmente falam che!